
(caio f. me entenderia. acho que, em especial, porque ele entendeu de fazer muitas coisas erradas, pedir desculpas, amar pessoas erradas e escrever sobre elas. caio f., certamente, me entenderia.)
eu sou diferente do que eu escrevo. o que eu escrevo é um momento e cada momento há de passar. assim sendo, tudo que escrevo se perde. e se perdendo de mim faz com que, automaticamente, eu seja diferente agora do que escrevi há dois anos atrás. é como mágica. não passa de ilusão, de uma alusão ao real momentâneo. cada segundo é criação e morte de uma nova nuance sentimental. será que você me entende? será que você entende quando me lê que eu escrevo para você?
o escritor é mesmo um ser cruel que inventa e vive apaixonando-se pelo menos óbvio, buscando incessantemente um sofrimento qualquer que se transponha para o papel. vou assim matando-me. e faço isso para que você me leia em diferentes situações. rasgo o que for antigo, o que eu disse e precisou, por motivo qualquer, ser desdito. rasgo as lembranças em prol do que virá, se é que virá.
você me vê até como um pedaço de carne, como uma garotinha de vinte e poucos anos, como um par de pernas, um par de seios e uma boca saliente. mas você não sabe - creio eu que não saiba, não há como saber - que é exercendo essa miserável sina de quem escreve que ponho todas as diferenças, todos os diferentes momentos, todas as diferentes nuances do meu sentimento aqui.
"é porque é para você, para você que escrevo — e não entende nada."**
"and then, one day he said:
'girl it's been nice, but i have to go sailing'
with cinnamon lips that did not match his eyes
he let me go."
(snow cherries from france; tori amos.)
** in anotações insensatas, caio f.
